Portugal tem um novo fenómeno pop à escala planetária — e nasceu de um resultado modesto no Festival da Eurovisão. Quando o quarteto lisboeta NAPA abandonou o palco da final em Basileia, a 17 de maio, muitos fãs sentiram o déjà-vu da frustração: apesar de uma atuação vibrante, “Deslocado” terminou num distante 21.º lugar. Seis semanas depois, na sexta-feira 27 de junho, a desilusão deu lugar à euforia. Segundo a Universal Music Portugal, o tema uptempo em português ultrapassou 20 milhões de reproduções no Spotify, alcançou o 5.º posto do Global Viral e lidera tabelas tão díspares como as de Itália, Espanha, Luxemburgo, Argentina e Uruguai — além da própria casa.

O impulsionador TikTok

Nada disto aconteceu ao acaso. Logo após a final, influenciadores brasileiros e ibéricos começaram a casar “Deslocado” com uma coreografia de braços frenética no TikTok. Em dias, o som foi usado em mais de 200 000 vídeos, somando impressionantes 880 milhões de visualizações. Essa onda empurrou curiosos para Spotify, Apple Music e YouTube e, em meados de junho, a faixa era já a mais partilhada no sul da Europa. A audiência mensal dos NAPA no Spotify explodiu para 1,7 milhões de ouvintes, transformando um grupo indie obscuro num dos nomes portugueses mais falados da década.

Uma vaga de dados que atravessa continentes

O alcance global surpreende. Na Europa Ocidental, o single é n.º 1 em Itália, top 3 em Espanha e figura no top 10 em França, Reino Unido e Alemanha. Nas Américas, lidera as listas virais de Argentina, Paraguai e Uruguai e mantém-se no top 10 de Bolívia, Peru e República Dominicana. Mesmo em regiões pouco permeáveis ao português — Escandinávia, Europa de Leste ou Golfo — “Deslocado” surge entre as dez faixas mais partilhadas. Observadores do sector apontam a duração enxuta de 2:30, um refrão-mantra de palavra única e o facto de o algoritmo do TikTok favorecer hoje conteúdos não-anglófonos que viajam bem além das fronteiras linguísticas.

O que isto diz aos recém-chegados a Portugal

Para estrangeiros a fixar-se no país — ou a ponderar a mudança — “Deslocado” confirma que as exportações culturais portuguesas já escapam ao circuito lusófono tradicional. Tal como o futebol de Cristiano Ronaldo ou a cozinha estrelada de José Avillez, o pop contemporâneo made in Portugal torna-se referência partilhada lá fora. A ascensão da canção coincide com a previsão de um verão turístico recorde e com a competição da cena tech, centrada em Lisboa e Porto, por talento internacional. Em cafés de Braga ao Algarve, é tão provável ouvir “Deslocado” como o mais recente êxito norte-americano ou sul-coreano — um ponto de conversa fácil com vizinhos, colegas ou bartenders.

Olhando em frente

Executivos da Universal confirmam que já se prepara um remix em inglês-espanhol com um nome forte da pop latina, enquanto os NAPA têm presença marcada em vários festivais europeus — incluindo um lugar de destaque no NOS Alive, em Oeiras, no próximo mês. Seja ou não capaz de igualar a viralidade do original, “Deslocado” já conseguiu o improvável: transformar um modesto 21.º lugar na Eurovisão num verdadeiro sucesso de exportação e pôr os holofotes internacionais sobre a música portuguesa como não se via desde “Amar Pelos Dois”, de Salvador Sobral, em 2017.